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17/12/2024

Garantia da execução fiscal: preferência da Fazenda Pública por dinheiro versus princípio da menor onerosidade ao devedor

Contestar, na esfera judicial, a cobrança de tributos realizada pela Fazenda Pública através de uma Execução Fiscal (ação utilizada pela Fazenda Pública para cobrar suas dívidas fiscais) é uma tarefa complexa e exige, antes de tudo, a garantia do crédito em cobrança.

A tomada de decisões bem informadas e adequadas durante o trâmite do processo executivo é fundamental para os contribuintes, pois erros e omissões podem levar a consequências graves, como o bloqueio de ativos financeiros e até mesmo prejuízo nos meios de defesa da parte. No entanto, com a orientação de especialistas, o contribuinte poderá seguir o processo com segurança e equilíbrio.

A execução fiscal é regulamentada pela Lei nº 6.830/1980, a Lei de Execuções Fiscais (LEF).

Para o processo começar a tramitar na esfera judicial, a Fazenda Pública deve elaborar a Certidão de Dívida Ativa (CDA), que contém as principais informações acerca da dívida em cobrança. Após isso, ajuíza a execução fiscal e solicita a citação do contribuinte.

Uma vez citado, o devedor tem o prazo de cinco dias para pagar a dívida ou garantir a execução. Conforme disposto no Art. 9º da LEF, a garantia pode ser feita por meio de depósito em dinheiro, fiança bancária, seguro-garantia ou nomeação de bens à penhora. A apresentação de garantia permite ao executado opor embargos à execução, que são a principal via de defesa do contribuinte, possibilitando a discussão do débito perante o Poder Judiciário.

Entretanto, o contribuinte se depara com um obstáculo maior nessa parte do processo: a Fazenda recusar determinadas garantias.

Mas a Fazenda pode recusar as garantias ofertadas pelo contribuinte?

Conforme entendimento do Ministro Herman Benjamin no AgInt no Agravo em Recurso Especial nº 1.844.031/GO (2021/0051645-2), a Execução Fiscal é um processo que tramita inteiramente no interesse do credor, no caso, a Fazenda Pública, a qual tem a opção de recusar garantias diante da ordem de preferência prevista nos arts. 9°, incisos I e II, e 11, da Lei n° 6.830/80. Observa-se o que dispõem tais dispositivos legais:

Art. 9º – Em garantia da execução, pelo valor da dívida, juros e multa de mora e encargos indicados na Certidão de Dívida Ativa, o executado poderá:
I – efetuar depósito em dinheiro, à ordem do Juízo em estabelecimento oficial de crédito, que assegure atualização monetária;
II – oferecer fiança bancária ou seguro garantia; (Redação dada pela Lei nº 13.043, de 2014)
III – nomear bens à penhora, observada a ordem do artigo 11; ou
IV – indicar à penhora bens oferecidos por terceiros e aceitos pela Fazenda Pública.

Art. 11 – A penhora ou arresto de bens obedecerá à seguinte ordem:
I – dinheiro;
II – título da dívida pública, bem como título de crédito, que tenham cotação em bolsa;
III – pedras e metais preciosos;
IV – imóveis;
V – navios e aeronaves;
VI – veículos;
VII – móveis ou semoventes; e
VIII – direitos e ações.

Seguindo a linha do julgamento mencionado acima, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já proferiu outras decisões sobre a possibilidade de a Fazenda Pública não aceitar todas as formas de garantia e preferir o depósito em dinheiro como garantia dos executivos fiscais. Observa-se, por exemplo, as seguintes ementas:

TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. EXECUÇÃO FISCAL. TAXA DE CONTROLE E FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL. NOMEAÇÃO DE BENS À PENHORA. CARTA FIANÇA. PRINCÍPIO DA MENOR ONEROSIDADE. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL NÃO DEMONSTRADA. RECUSA DA EXEQUENTE POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO.
I – Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. In casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015.
II – A garantia da execução fiscal de crédito tributário por fiança bancária ou seguro-garantia não é realizada exclusivamente por conveniência do devedor, podendo a exequente recusar tanto a oferta da penhora em detrimento do dinheiro, quanto à pretensão de substituição do bem penhorado, cabendo à devedora demonstrar a necessidade de aplicação do princípio da menor onerosidade, o que não ocorreu. Precedentes.
III – Em regra, descabe a imposição da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do Código de Processo Civil de 2015 em razão do mero desprovimento do Agravo Interno em votação unânime, sendo necessária a configuração da manifesta inadmissibilidade ou improcedência do recurso a autorizar sua aplicação, o que não ocorreu no caso.
IV – Agravo Interno improvido. (Grifou-se)
(BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão no AgInt nos EDcl nos EDcl no REsp nº 2.056.386/SC, Relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 9/10/2023, DJe de 16/10/2023. Disponível em: <https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202203925470&dt_publicacao=16/10/2023>.)

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. OCORRÊNCIA. EXECUÇÃO FISCAL. DEPÓSITO EM DINHEIRO. ORDEM LEGAL DE PREEFERÊNCIA. OBSERVÂNCIA. EXCEPCIONALIDADE. REVISÃO DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE.
1. Configura-se a preclusão consumativa quando a parte deixa de suscitar a matéria no momento adequado, sendo certo que, no caso dos autos, a contribuinte deixou de recorrer da decisão, em embargos à execução, que não conheceu do recurso e homologou a desistência da apelação, apresentando sua irresignação referente à fixação da verba honorária tão somente em momento posterior.
2. Em julgamento do Recurso Especial 1.337.790/PR, submetido ao rito do art. 543-C do CPC/1973, a Primeira Seção desta Corte de Justiça sedimentou o entendimento de que a parte executada deve nomear bens à penhora com a observância da ordem legal de preferência estabelecida no art. 11 da Lei n. 6.830/1980, a qual, por força do princípio da menor onerosidade, só poderá ser mitigada mediante comprovada necessidade.
3. A penhora de ativos financeiros, que corresponde a penhora em dinheiro (REsp repetitivo 1.112.943/MA), por si só, não revela a excessiva onerosidade, competindo ao devedor o ônus de comprovar, no caso concreto, que a indisponibilidade dos recursos financeiros põe em risco a sua subsistência e indicar outras garantias igualmente eficazes para a satisfação do crédito.
4. O Tribunal de origem concluiu que a recorrente não demonstrou a excepcionalidade que autoriza a impenhorabilidade dos valores depositados na conta corrente das executadas e que, para decidir de forma diversa, seria essencial a incursão no quadro fático-probatório dos autos, o que atrai a aplicação da Súmula 7 do STJ.
5. Agravo interno desprovido. (Grifou-se)
(BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão no AgInt no REsp n. 2.121.137/RJ, Relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 21/10/2024, DJe de 28/10/2024. Disponível em: <https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202400273364&dt_publicacao=28/10/2024>.)

É relevante destacar, que nas decisões acima, o Tribunal dá ênfase no princípio da menor onerosidade.

Mas o que seria esse princípio e como pode auxiliar os contribuintes no processo executivo fiscal?

Conforme disposto no art. 805 da Lei nº 13.105 de 16 de março de 2015, a execução deve ser realizada pelo modo menos gravoso para o devedor, desde que não prejudique os direitos do credor.

Como mencionado acima, a Fazenda Pública pode vir a negar a garantia ofertada e, de praxe, pedir a penhora de dinheiro, no valor da dívida executada. O contribuinte tem a chance de justificar o motivo pelo qual ofereceu tal garantia, invocando o princípio da menor onerosidade, salientando a ausência de disponibilidade financeira ou como a penhora de dinheiro afetaria o funcionamento da empresa e a sua atividade econômica. Por exemplo, poderia exercer sua defesa anexando documentos e comprovando que o dinheiro que possui tem destinações específicas, como pagar funcionários, empréstimos, outros tributos e abastecer estoques.

Dessarte, é possível ofertar em execução fiscal, por exemplo, o seguro garantia, a carta de fiança bancária ou imóveis, já que listados nos artigos 9º e 11 da LEF. Porém, estes bens só estarão acima do depósito em dinheiro quando informado e comprovado que, na determinada situação, a pessoa jurídica não tem tal disponibilidade financeira ou o dinheiro oferecido à penhora pode prejudicar o funcionamento da empresa.

No entanto, cada caso é único e deve demandar uma análise detalhada e uma estratégia específica.

Os profissionais da Queiroz Miotto Advogados estão à disposição para prestar maiores esclarecimentos sobre o assunto.

 

Maria Luiza Perovano Rocha e Suelem Salette Padilha

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